quarta-feira, 26 de maio de 2010

Kurt Rosenwinkel em Porto Alegre



Graças ao público gaúcho e a iniciativa de algumas produtoras em apostar no jazz fora do eixo Rio-São Paulo, um cativante nome do jazz acabou de se apresentar na cidade. O guitarrista Kurt Rosenwinkel subiu ao palco do Teatro CIEE pontualmente às 21h, o que é raro em espetáculos atuamente.
Acompanhado de Ted Poor na bateria e Eric Revis no contrabaixo acústico, o trio ataca com Sandu, um blues leve, algo bem tradicional. Logo depois vem Reflections, de Thelonious Monk, que chega com mais energia e uma melodia menos ‘convencional’, solos mais encorpados e espasmos corporais: resultado das leituras que o songbook de Monk desperta em seus intérpretes.  Invitation também não deixa o público no básico ‘trio-standard-de-jazz’ e se transforma no ápice do show. Diversos slides na guitarra, arpejos rápidos do baixista e muita força nos pratos de Poor acharam o caminho mais criativo para balançar a cabeça de várias pessoas sentadas literalmente, assim como eu.  
Não é surpresa quando um músico de respeito toca ao vivo e você está lá para escutar. Surpresa é esse respeito aumentar e se espalhar pela música já costumaz  dos fãs e não oferecer um canto pro improviso, mas a estrutura inteira. Após tamanho jato de energia que cada soco (do bem) na bateria era sentida na barriga e um acorde mais ousado era dedilhado com facilidade por cima da coxa, Darn That Dream, outro pedaço de tradição do jazz clássico, foi a realização mais fiel da noite. Como a proposta de trio superficialmente traz, a idéia aqui era de suprimir ao invés de acrescentar: notas demais em um arranjo antigo as vezes atrapalha.
Panelinha entre músicos de todo o mundo, mas principalmente os norte-americanos, Insensatez (ou How Insensitive) veio calma e serena, sem tentativas de virtuosismos e tomada por levadas meigas. Não é novo estrangeiros improvisarem sobre a bossa nova e mudarem o andamento, porém Rosenwinkel levou a composição mais pra Django Reinhardt do que pra Baden Powell. Não sei se fui feliz nessa comparação, mas penso que o ritmo de Kurt traz algo de Django bastante sutil, um toque mais fluído e menos pensado que o West Montgomery faria, por exemplo.
Ao anunciar a última música do concerto, Kurt veio com uma forte despedida. Cheryl, gravada por ele, não era o tour-de-france de Invitation nem a complexa Reflections: foi além na mistura de empolgação e escalas sofisticadas sem um movimento brusco de habilidade sequer. Aqui os três músicos novamente levaram o improviso além-mar e trouxeram a lembrança de que nem todos são rápidos ou com carreiras musicais brilahntes pela frente, mas podem entender e se entreter com o som que Rosenwinkel fez esta noite.
Claro, o bis também não ficou feio. Sem dizer o que estava interpretando (e acredito que foi uma grande inveção de momento, leia-se improviso), Poor abocanhou 5 minutos e fez melodias mágicas com a bateria, tornando acompanhá-lo um desafio aos seus companheiros. Revis fez diversas entradas e preparou melodias pra si que trouxeram um ar de seriedade pro show como um todo, sempre econômico e fluorescente. Algo que notei no jeito de Rosenwinkel tocar foram os 'finais infinitos’ que praticava. Ao fim de todas as músicas, os floreados e lugares comuns eram reajeitados assim que chegavam, os bordões não encontravam espaço jamais. Ele se esmerou (as vezes com força) para terminar com originalidade total, sem passados. Ficou bacana assistí-lo estudar as melhores terminações possíveis e não se entregar ao previsível.
Assim, uma hora e meia de show foram quinze minutos e três horas no mesmo espaço de tempo. Espero que as performances musicais na capital gaúcha cresçam e se multipliquem com a mesma qualidade que o de hoje. Preços acessíveis e lugares confortáveis é o básico e mesmo assim um luxo para o público e o artista. Que fique dita minha opinião, como jornalista e como espectador.
Assista abaixo o guitarrista interpretando 'Round Midnight (ao vivo na Polônia em 2009)

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